sábado, julho 06, 2013

Miau



Quando eu sair desta terra,
As folhas amarelas das árvores 
continuarão a cair no chão

Quando eu sair desta terra,
Os passarinhos continuarão a cantar
O sol continuará a brilhar dia após dia

Os gatinhos continuarão a miar
O vento continuará a soprar no ouvido
Esperança e alegria
continuarão nos sorrisos das crianças

Quando eu sair desta terra
Quando me unificar com o anoitecer
Poucas lágrimas ficaram por cair
... E que melhor forma haverá do que desvanecer
em moléculas sozinhas?


sábado, junho 15, 2013



É impossível reunir as palavras

Dispersas pelo monte como ovelhas

É difícil pousar a cabeça e pensar, discorrer ou dormir

É escasso o espaço para opções ou sonhos

Miragens !


Abro a mão: contido som sustenido mendigo

O meu sorriso sem motivo

A irracionalidade salva-me do precipício

As minhas frases desconexas e as palavras que ecoam no ar

É tudo o que possuo ou que me é permitido construir


E no meio de tudo isto, a exigência de ser inteligível... !

Pode o mar guardar-se numa gaveta, ordeiro ?



domingo, março 03, 2013


Dissolução

Inexisto e insisto
Na sombra da árvore

Perante o inoportuno
Uma nulidade aérea
Beija a areia no chão
E os grãos desfiam-se, multiplicam-se
Deslizam pelo vento
Ecos que imitam catarses
Pelo tempo

No vento o chão implora
Por mais afetividade

Mas os grãos desintegram-se
Desfiam-se,
Desaparecem
Misturam-se com a paisagem
Caem sobre nós sem sabermos

A dissolução emerge desamparada
E o cântico final é silenciado.


sábado, fevereiro 02, 2013

(24-06-2008)

Enquanto Júpiter dança, I am enchanted by Venus. Portanto, mesmo nas tuas múltiplas imperfeições, existe alguma melodia consistente. Mesmo quando penso que és oriundo de um qualquer planeta longínquo e que para ti todas as minhas suposições são como a areia de praia.


Um grande não às sombras que se esfumam
Onde estou eu
Escondida no perigoso mundo benévolo. Que me desatem as cordas apertadas para emergir à superfície

Não há distância
Nem perto nem longe
Não há pressa nem lugar.

(17-01-2012)

O nosso amor era um cancro
Um vício que nos levou ao fim do mundo

O nosso amor era um ser especial
Talvez deficiente, talvez
Extraterrestre
Extra-sensorial
Que não recebemos de braços abertos
Que não acarinhámos por ser diferente
Que não investigámos cientificamente.
Transformou-se num monstro indesejado, aos nossos olhos.

O nosso amor foi um acidente que me levou a alma e a inocência.

A névoa (17-04-2009)

Málgama caminhava sobretudo por Sintra, por entre as ruas fantasmagóricas e por entre auras de duendes e espadas envolvidas em romances escondidos. Entre aqueles dias, nada mais existia sem ser a totalidade do ser preenchida, com o espírito sentido de mistérios reflectidos nas águas do lago.
Não haviam horários nem predeterminações, nem horas. Horas de regras... horas de obrigações... de realidades desvigorantes.
Málgama apercebeu-se, um dia, de que já não era a mesma pessoa que viajava antes sem rumo por Sintra, mergulhada nos livros e nos aromas de jardim, místicos. Porque agora, mesmo para respirar, tinha o tempo contado ao minuto.
Entristecia-se então por ter perdido esses tempos de liberdade, em que não haviam prazos exagerados, nem exigências desmesurados, por entre filosofias e teorias utópicas, sem responsabilidades acrescidas.

Os seus lábios já não ardiam na expectativa daquele beijo implosivo. Até que Málgama começou a sentir-se atraída por outros que cruzavam o seu quotidiano. E a sentir-se apaixonada por cada toque leve que algum lhe atribuia.

Noutros dias, voltava de repente a sentir a mesma volúpia e a mesma intensidade de antes, o que a envolvia cada vez mais na confusão interna.

Málgama compreendeu que aquela solidão sentida tinha por base o facto de que a paixão de outrora fora construída em determinadas circunstâncias e conjunturas e que, uma vez perdidos esses mesmos contextos, também assim sucederia com a própria paixão.
Sendo nós pessoas diferentes, necessariamente sentiremos paixões diferentes. Ou então que o amor se modifique connosco, tentando apanhar-nos, se conseguir...

Half joke - half poem

Em cima daquela pedra está um dedo de cortiça.
O dedo não tem anel. O anel não tem dedo.
Surgiu assim numa manhã de neblina.
Dormia na penumbra, o ser descrente, o céptico.
A pata da gatinha não se importa de estar debaixo do computador.


O morto, cadáver no chão
Começa já o processo de decomposição. Não quero explicações.
Morreu de repente? Padeceu de uma doença prolongada? Qual a causa? A que horas?
Estava sozinho? Quem descobriu a perda?

Etéreo anjo sublime ancorado nas névoas do desaparecimento.
Não sei como se perdeu o espírito.


O significado das tardes leves

E as folhas no chão, que eram verdes, caíram naturalmente
Caíram de tão maduras que estavam, porque deram toda a vida em si ao mundo

A árvore não receou que caíssem, nem teve medo do posterior abandono ou nudez

Mas, ao espelho vejo uma árvore que expulsa as folhas apenas suspeitas de caírem,
Antes nua do que com um vestido de folhas inconsistente!...