quarta-feira, janeiro 28, 2009




Puxo o cordão da alma para não subir céus. A vontade era de voltar a descer só depois de lá chegar. De me espalhar por cima de Lisboa e cair em todos, em cima de todos um pouco do meu pó. O peito bate mais e cada vez mais até saltar até sair para fora de dentro para todos para cima de todas as cabeças, sobre a Praça da Alegria. As pessoas comentariam: "Reparem, está hoje a cair outra vez poeira".
E seria apenas o som de um cair objectivo... de pó leve.


domingo, janeiro 11, 2009


Irmão

Adoravas simplesmente falar. Nós eramos as duas faces opostas da mesma moeda. Tu falavas com todos, desconhecidos ou não, sentias curiosidade por tudo e as pessoas comentavam como eras muito esperto para a idade. Eu, sempre prisioneira, dizia-te às vezes para falares mais baixo. Desculpa. Não foi por mal.

Eu estava nos teus dias quando deixaste de falar correctamente. Víamos televisão e de repente o dia quebrava-se por inteiro. A felicidade deixava-nos a pouco e pouco. É estranho como num momento tão rápido, desaparecem as esperanças para todo o resto de uma vida. A impossibilidade de retroceder. O não controlo sobre uma circunstância tão entre nós. A tua gaguez.

Depois noutra altura começou a tua mão a tremer e por fim também perdemos o controlo na perna que te impediu de andar normalmente. O que me levava a seguir-te por todo o lado, com receio que caísses. Nós, que antes caminhávamos ao sabor de histórias místicas, reais...

Ai! Por vezes ainda desejo secretamente perder um braço ou uma perna. Apenas para expressão de dor interna. Para que fosse visível e nítido que, apesar da perda inqualificável, ainda tento prosseguir. No entanto, é assim que me constituo, como um ser humano cortado. Sinto-me alegre ao imaginar olhares para mim sem eu ter o braço direito.